quinta-feira, 26 de julho de 2012

Grandes Times: A Celeste Olímpica

Em clima olímpico, nada mais adequado que iniciar a Seção “Grandes Times” com o maior time a jogar nas Olimpíadas, a Celeste Olímpica.

O time a que se refere o parágrafo acima é a seleção uruguaia que dominou o futebol sul-americano e mundial de 1924 a 1930. Um time revolucionário. Diferenciado. Multi-campeão.

Tudo começou em 1923, quando o escrete uruguaio venceu a Copa América pelo número máximo de pontos, batendo na final a sua grande rival, Argentina, pelo placar de 2 a 0, com destaque para o jovem Pedro Petrone, na época, com singelos 18 anos de idade.

Os uruguaios já revolucionavam fora de campo, antes das partidas. A comissão técnica, na qual se incluíam médicos e preparadores físicos, era tão importante quanto o treinador e os próprios jogadores. Para a época, o preparo físico da equipe era fantástico.


Olimpíadas de 1924

Para a sua primeira investida em âmbito mundial, o torneio Olímpico de 1924, em Paris, o Uruguai se concentrou no vilarejo de Argenteuil, interior da França. Antes disso, fizeram uma turnê muito bem sucedida pela Espanha. Em amistosos, os europeus passaram a se maravilhar com o estilo de jogo dos cisplatinos.

Pouco se sabia sobre os uruguaios, por conta de nunca terem jogado qualquer partida fora da América do Sul. Suas partidas internacionais se resumiam, basicamente, a viagens atravessando o Rio da Prata, para intercâmbio com times argentinos.

Diferente das tendências futebolísticas da época, os uruguaios tocavam a bola em passes curtos e precisos, com controle de bola majestoso. Quem duvidava, passou a se admirar. Tanto foi a admiração que, em Paris, um dos maiores jogadores da história uruguaia, o grande meio-campista Leandro Andrade, foi apelidado já de inicio como “La Marveille Noire”, ou seja, a Maravilha Negra, tamanha a sua qualidade técnica.

No início dos Jogos Olímpicos de 1924, o grande assunto era o jogo dos uruguaios. Surpreendentemente para a época, os uruguaios combinavam passes curtos com posicionamento inteligente, técnica e controle de bola imaculados. A expressão utilizada era que, como se diz coloquialmente hoje, “quem corria era a bola” e os oponentes, atrás dela.

Bateram os iugoslavos na estreia por 7 a 0, depois os norte-americanos por 3 a 0. No segundo jogo, os americanos tiveram que armar uma fortíssima retranca para não sofrer uma derrota pesada. Era o início do domínio do futebol mundial pelos charruas. Na terceira fase, derrotaram facilmente os franceses, donos da casa, por 5 a 1.

Na semi-final, um polêmico jogo. Contra a Holanda, os uruguaios saíram perdendo no primeiro tempo, com um gol de Kees Pijl. No segundo tempo, aos 25 minutos, Pedro Cea empatou a partida. Faltando menos de 10 minutos, pênalti para os uruguaios. Héctor Scarone virou a partida e decretou o placar final, 2 a 1.

A final foi disputada contra a Suíça, que bateu a Suécia na semi-final. Assim como os adversários anteriores, a seleção helvética não foi capaz de ombrear os seus rivais sul-americanos. O Uruguai prevaleceu por 3 a 0, gols do jovem Pedro Petrone, Pedro Cea e Ángel Romano. O interesse pelos uruguaios era tanto que o público total do estádio foi de 60.000 pessoas, sendo que 10.000 ficaram de fora do estádio.

O Uruguai conquistava seu primeiro título de nível mundial, a medalha de ouro no futebol olímpico em 1924. Mais do que merecido.

A escalação campeã: Andrés Mazali; Pedro Arispe, José Nasazzi (que viria a ser o primeiro homem a erguer o troféu Jules Rimet); Leandro Andrade, José Vidal, Alfredo Ghierra; Santos Urdinarán, Héctor Scarone, Pedro Petrone, Pedro Cea e Ángel Romano.



Duas curiosidades do título de 1924: a “Volta Olímpica”, que ocorre quando um time campeão vence um torneio, foi inventada pelos uruguaios neste torneio, que saudavam os espectadores correndo toda a extensão da pista atlética ao redor do gramado. Além disso, o jovem Pedro Petrone, que no dia do título contava 18 anos e 363 dias, é, até hoje, o mais jovem jogador de futebol a receber uma medalha de ouro olímpica.


Olimpíadas de 1928

Em 1928, nas Olimpíadas de Amsterdã, pouco se discutia sobre os favoritos. Os uruguaios eram favoritos, seguidos pelos seus grandes rivais, a Argentina. O choque da vitória em 1924 foi sentido no mundo todo, e obviamente, pelos argentinos. Em um amistoso de dois jogos, torcedores argentinos jogavam mísseis em Leandro Andrade, para que este não pudesse avançar em campo, tamanha a violência e tensão!

Os uruguaios, sem temer nada, mandaram novamente um time excelente, baseado predominantemente no Peñarol e no Nacional. Praticamente, era a mesma equipe que disputaria e venceria a Copa do Mundo de 1930, no próprio Uruguai.

Na estreia, vitória contra os holandeses, 2 a 0, desta vez sem a controvérsia que rodou o torneio passado. Contra a Alemanha, vitória tranquila por 4 a 1, com três gols do já afirmado artilheiro Pedro Petrone.

Na semi-final, jogo contra a forte Itália. A Itália, previndo o que viria na década de 30, abriu o placar com Baloncieri. Entretanto, a equipe cisplatina virou para 3 a 1 ainda na primeira etapa, quebrando os brios italianos. A partida terminaria 3 a 2, num grande embate.

Na partida da medalha de ouro, guerra contra os argentinos. Os platinos vinham de grande campanha, batendo os norte-americanos por incríveis 11 a 2, a Bélgica por 6 a 3, e o Egito por 6 a 0. 


Na primeira partida, empate em 1 a 1, gols de Petrone pelos celestes e Manuel Ferreira para os argentinos. Na época, teria que ser disputada uma nova partida para quebrar o empate.

No segundo jogo, dia 13 de junho de 1928, Argentina e Uruguai se digladiaram pela segunda vez. E desta feita, sagrou-se um incontestável vencedor. Dois a um para os cisplatinos, gols de Roberto Figueroa e Héctor Scarone. Uruguai medalhista de ouro no futebol novamente!

A escalação campeã, muito parecida com a de 1924: Andrés Mazali; Pedro Arispe, José Nasazzi; Álvaro Gestido, Juan Píriz, Leandro Andrade; Roberto Figueroa, Pedro Cea, René Borjas, Héctor Scarone e Juan Pedro Arremón.

Mas este não seria o último grande confronto entre uruguaios e argentinos da época...


Copa do Mundo de 1930

O duas vezes campeão olímpico Uruguai iria ser anfitrião da primeira Copa do Mundo da FIFA, no ano de 1930, entre os dias 13 e 30 de julho. O país-sede foi escolhido, pois neste ano, a Constituição da República Oriental do Uruguai completaria 100 anos de aniversário. Todas as partidas seriam realizadas na cidade de Montevideo, divididas em três estádios, Parque Central, Pocitos e principalmente, o Centenario, construído especialmente para a Copa, e que recebeu a maioria das partidas.

O torneio teria apenas treze participantes, a maioria da América do Sul, bem como os Estados Unidos e o México. Como a viagem da Europa para a América ainda era por navio, apenas França, Iugoslávia, Romênia e Bélgica participaram.

O Uruguai ficou no Grupo 3, com Peru e Romênia. A primeira vitória foi contra o Peru, jogo truncado, vitória magra, por apenas 1 a 0, gol de Héctor ‘Manco’ Castro. Seu apelido provinha de um acidente na infância, onde teve seu antebraço direito amputado por uma serra elétrica.

O segundo jogo já foi mais tranquilo, com os celestes já mais habituados à disputa. Vitória tranquila de 4 a 0 sobre o time romeno, com os quatro gols marcados na primeira etapa, por Pablo Dorado, Héctor Scarone, Peregrino Anselmo e Pedro Cea, nesta ordem.

Para as semi-finais, os quatro campeões dos grupos, Argentina, Iugoslávia, Uruguai e os Estados Unidos, se enfrentariam. A primeira semi-final, entre E.U.A. e Argentina foi disputada em um campo completamente encharcado. Foi uma partida violenta, tendo o jogador americano Raphael Tracy saído machucado com uma perna quebrada. O jogo terminou 6 a 1 para os violentos argentinos.

A outra partida, logo, foi disputada por uruguaios e iugoslavos. Foi uma pequena réplica da partida que ocorrera nas Olimpíadas de 1924. A Iugoslávia começou vencendo, com um gol de Djordje Vujadinovic. Mas os uruguaios viraram ainda no primeiro tempo, logo antes de um gol iugoslavo ser polemicamente anulado por impedimento. No final, o jogo terminou em 6 a 1, com Pedro Cea marcando três gols.

Enfim, a grande final. Uma repetição da última decisão das Olimpíadas de Amsterdã. A grande rivalidade voltava a aflorar, Argentina e Uruguai, agora disputando o galardão de maior time do planeta.

O clima era muito tenso de ambas as partes. Milhares de torcedores argentinos atravessaram o Rio da Prata, bradando: “Vitória ou morte”! Cerca de 15 mil argentinos tentaram a travessia para Montevideo, entretanto, muitos não lograram sucesso. O clima era tão hostil, que o jogador argentino Luisito Monti recebeu ameaças de morte na noite anterior à partida, mesmo assim, disputou a final.

No estádio, os torcedores foram revistados pela polícia em busca de armas. O Estádio Centenario já estava completamente lotado duas horas antes do pontapé inicial, 93 mil espectadores.

Um acontecimento estranho ocorreu neste jogo. Por conta de um desentendimento entre os times, sobre qual bola seria usada no jogo (cada time tinha a sua), foi decidido que seria um tempo para cada bola. A da Argentina, no primeiro tempo, a do Uruguai, no segundo. Polêmico, mas foi a solução encontrada.


Outra situação inusitada foi o pedido do árbitro, John Langenus, que apenas aceitou apitar a partida se tivesse disponível um barco de prontidão no porto, para que, se fosse necessária uma fuga rápida, pudesse escapar em no máximo uma hora do fim do jogo!

Confusão generalizada à parte, o jogo iniciou. Os anfitriões abriram o placar com Pablo Dorado. Entretanto, ainda no primeiro tempo, a Argentina se mostrou forte, virando a partida, com gols de Carlos Peucelle e do artilheiro do torneio, Guillermo Stábile.

O segundo tempo começou perigoso para o Uruguai, quase levando o terceiro gol, que selaria o destino do jogo. Após isso, os cisplatinos se recompuseram, empatando primeiro com Cea. Dez minutos depois, Santos Iriarte virou o jogo. Pouco antes do fim do jogo, ‘Manco’ Castro marcou o gol derradeiro, 4 a 2, para selar a vitória. Langenus encerrou a partida apenas um minuto depois, coroando os uruguaios como campeões do mundo.

Os comandados de Alberto Supicci naquele jogo: Enrique Ballestero; José Nasazzi, Ernesto Mascheroni; Leandro Andrade, Lorenzo Fernandez, Álvaro Gestido; Pablo Dorado, Héctor Scarone, Héctor ‘Manco’ Castro, Pedro Cea e Santos Iriarte. (conforme a foto no título)

Sem dúvida alguma, este foi o primeiro grande time a encantar o mundo todo, com seu novo jeito de jogar e seus grandes jogadores. Leandro Andrade e o capitão José Nasazzi são até hoje cultuados como dois dos maiores jogadores da história do futebol sul-americano.

A Copa do Mundo não poderia ter caído em melhores mãos naquela época. Estava eternizado o apelido que até hoje a Seleção Uruguaia leva: “A Celeste Olímpica”.

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