Às vezes, o tamanho do seu reconhecimento pode ser definido pelo lado do muro onde você nasce. Foi o caso do injustiçado goleiro Jürgen Croy.
Nascido em 19 de outubro de 1946, em Zwickau, na Alemanha ocupada pelos Soviéticos, que se tornaria, logo após, a Alemanha Oriental - também conhecida como República Democrática da Alemanha - pouco mais de um ano após a II Guerra Mundial, Croy foi um dos maiores goleiros da história. Entretanto, é muito pouco conhecido pela maioria dos fãs do Futebol.
Filho de um encanador, desde os oito anos de idade o jovem Jürgen era envolvido com o Futebol, atuando, primeiramente, como meia-atacante. Após chegar ao BSG Motor Zwickau - depois conhecido como BSG Sachsenring Zwickau, único clube que defendeu - foi "recuado" ao posto de goleiro, tendo em vista seu grande e incomum porte físico.
O seu progresso como guarda-metas foi tanto, que em 1963, com tenros 16 anos de idade, Croy teve sua primeira convocação para as seleções de base da Alemanha Oriental, em partida contra a Romênia, a qual sua equipe venceu por 4 a 1.
No ano de 1965 veio a primeira grande glória para Jürgen: o título do Campeonato Europeu Sub-18, disputado na Alemanha Ocidental. A DDR - sigla alemã para República Democrática da Alemanha - surpreenderia o mundo do Futebol, sobrepujando países tradicionais no torneio, como a Holanda, Tchecoslováquia e, na final, a poderosa Inglaterra, que viria a ser campeã do mundo no ano seguinte.
Atuou nas divisões de base e na equipe reserva do Zwickau até a temporada 1965-66, quando, aos 19 anos de idade, substituiria Peter Meyer. Só deixaria o posto de titular no ano de 1981, quinze temporadas depois, quando se aposentou.
Em 1967, venceu o primeiro de apenas dois títulos com o seu clube, a Copa da Alemanha Oriental. No mesmo ano, receberia sua primeira convocação para a seleção principal da DDR, sendo reserva do mais experiente Wolfgang Blochwitz. O seu status de reserva duraria pouco, pois em 1968 já assumiria a titularidade, sendo absoluto até 1979.
Jürgen Croy ainda era praticamente desconhecido pelo mundo, até 1974, única oportunidade em que a DDR disputaria a Copa do Mundo.
Na maior vitrine futebolística do Futebol mundial, demonstraria sua grande técnica, atuando muito bem em todas as partidas. Em especial, fez parte de uma das partidas mais polêmicas já disputadas em uma Copa do Mundo, um embate contra a Alemanha Ocidental, na Primeira Fase de Grupos.
Neste certame, a totalmente inferior DDR bateu sua co-irmã Ocidental por 1 a 0, com um gol de Jürgen Sparwasser. Entretanto, os ocidentais pareciam desinteressados na partida, e suspeitava-se de uma fraude no tal resultado.
Analisando-se a tabela de classificação, valia mais a pena para a Alemanha Ocidental classificar-se em segundo lugar no grupo, para enfrentar na próxima fase a Iugoslávia, Suécia e Polônia. Em contrapartida, a DDR enfrentaria, tendo se classificado em primeiro lugar, o Brasil, Holanda e Argentina na fase seguinte.
Entretanto, polemicamente ou não, Croy se destacou como o melhor jogador de sua seleção, por conta das suas atuações seguras, pelas defesas cheias de reflexo e pelo garbo com o qual comandava a sua defesa.
Curiosamente, Croy era um dos poucos atletas da Seleção da Alemanha Oriental a não atuar pelas grandes potências de seu país - Magdeburg, Hansa Rostock, Dynamo Dresden e Carl Zeiss Jena - o que demonstrava ainda mais a sua qualidade como goleiro.
Em 1975, o Zwickau conquistou seu segundo e último título com Jürgen no gol, novamente a Copa da Alemanha Oriental. Croy foi o herói da final contra o superior Dynamo Dresden, defendendo duas penalidades após o tempo normal, e levando o clube para a Cup Winners' Cup - para nós, a Recopa da Europa - onde atingiriam um feito praticamente inacreditável.
Após uma trajetória fantástica, batendo, respectivamente, Olympiakos, Fiorentina - duelo que foi para a disputa de pênaltis, na qual, curiosamente, Croy converteu uma cobrança -, e Celtic, o BSG Zwickau sucumbiu apenas nas semi-finais, para o campeão e fantástico escrete do Anderlecht, no placar agregado de 5 a 0. Seria a última vez em que Croy disputaria um torneio de clubes internacional.
Incrivelmente, Jürgen sofreria, até o embate contra o Anderlecht, apenas 2 gols em seis partidas.
Após uma medalha de bronze nas Olimpíadas de Munique, em 1972, Jürgen Croy conquistaria sua grande glória, a medalha de ouro nas Olimpíadas de 1976, em Montreal, no Canadá, depois de uma vitória na final por 3 a 1 contra a fortíssima Polônia. Suas atuações no torneio lhe renderam grande reconhecimento no seu país, inclusive recebendo o título de Cidadão Honorário de Zwickau, sua terra natal.
A partir deste momento, Croy apenas atuou incessantemente e admiravelmente pelo BSG Zwickau, até o final de sua carreira, em 1981. Disputou, ao todo, nas suas 17 temporadas como jogador, 372 partidas oficiais pelo seu clube, deixando de jogar apenas 44 vezes por lesões sofridas.
No ano de 1983, Jürgen Croy foi apontado como treinador do Zwickau, permanecendo no cargo até 1988. Na sua trajetória, conseguiu duas vezes a promoção para a DDR-Oberliga, a primeira divisão nacional.
Atuou brevemente como Vice-Presidente da Federação de Futebol da Alemanha Oriental, até a queda do Muro de Berlim e a consequente reunificação com a Alemanha Ocidental, em 1990. Após, passou a se envolver com a prefeitura de Zwickau, atuando de 1994 a 2000 como Secretário de Cultura, Educação e Desporto, e desde 2000, é o Diretor-Geral da Câmara de Comércio, Turismo e Cultura da cidade.
Foi eleito o melhor jogador de seu país nos anos de 1972, 1976 e 1978, bem como considerado um dos maiores futebolistas da história da DDR, em eleição realizada em 1989.
Ainda, atuou 94 vezes com o uniforme da Alemanha Oriental, sendo o terceiro maior jogador em convocações pelo seu país.
Croy era um grande goleiro, em todos os aspectos possíveis. Com 1,90 m de altura e 85 kg, era um arqueiro alto e forte para a sua época; Entretanto, possuía grande velocidade, agilidade e reflexos muito apurados, o que o tornava capaz de defesas espetaculares.
Além das qualidades físicas, possuía também grande controle sobre seus defensores e sobre a situação dentro da grande área. Tinha boa qualidade com os pés, algo raro para um goleiro da época, além de sair muito bem do gol, bem como um ótimo posicionamento debaixo das traves.
Especialmente, era um atleta que, ao contrário da maioria, trabalhava fabulosamente sob pressão, e crescia nos momentos difíceis de seu time. Para completar, era um goleiro altamente confiável e regular, produzindo temporadas sólidas nas balizas do Zwickau e da Alemanha Oriental.
Foi considerado, no auge de sua carreira, um dos maiores goleiros da Europa, juntamente a grandes lendas do esporte, como Sepp Maier e Dino Zoff. A própria IFFHS, em alguns de seus rankings, o posicionou entre os 6 maiores goleiros da história do Futebol.
Apesar de sua qualidade indiscutível, Jürgen teve raras oportunidades de mostrar sua classe para o mundo, o que justifica parcialmente o pouco conhecimento do público em geral sobre a sua técnica.
Além disso, atuou profissionalmente apenas pelo clube da sua cidade natal, o BSG Zwickau, o que limitou sua visibilidade à poucas aparições em torneios continentais, bem como apenas dois títulos em nível nacional.
Tivesse Jürgen Croy nascido do outro lado do Muro de Berlim, muito provavelmente, teria sido ele o goleiro campeão do mundo em 1974, no lugar ocupado pelo igualmente majestoso Sepp Maier.
Infelizmente, poucos puderam realmente apreciar a grandeza das atuações de Croy. Entretanto, aqueles que puderam assisti-lo vestindo as cores azul e branca de seu país, bem como as cores do Zwickau, merecidamente o consideram um dos maiores arqueiros a pisar num campo de Futebol em todos os tempos.
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