Uma máquina de ganhar títulos.
Essa é a única introdução razoavelmente justa que se pode dar ao Grande Treinador do post de hoje, o lendário Ernst Franz Hermann Happel, conhecido popularmente apenas como Ernst Happel.
Ernst nasceu em Viena, no dia 29 de novembro de 1925, e começou a jogar Futebol nas categorias de base do Rapid Viena, aos 13 anos de idade. Estrearia na equipe principal com 17 anos, e defenderia o clube por 14 temporadas, em duas passagens, de 1942 a 1954 e 1956 a 1959. Entre os dois períodos jogando no Rapid, passou pelo Racing Club Paris - hoje Racing Club Colombes - por uma temporada.
Formou uma grande dupla com o veterano defensor Max Merkel, ganhando diversos títulos com o Rapid Viena, e recebendo a alcunha de Der Zauberer - alemão para "O Mago". Foi campeão da Bundesliga austríaca em seis temporadas - 1946, 1948, 1951, 1952, 1954, 1957 - da Copa da Áustria em 1946, e da Zentropa Cup - antigo torneio interclubes disputado na Europa Central - em 1951.
Era também uma presença constante na Seleção da Áustria, atuando em 51 partidas oficiais, marcando seis vezes. Fez parte dos esquadrões austríacos que disputaram as Copas do Mundo de 1954, na Suíça, e de 1958, na Suécia.
Iniciou uma das mais prolíficas carreiras de treinador em todos os tempos no ano de 1963, assumindo o comando do ADO (hoje conhecido como ADO Den Haag), da Holanda, clube que não obtinha sucesso a nível nacional desde 1943, quando ganhou o último título nacional de sua história.
O jovem treinador implantou um sistema diferente de jogo para os padrões holandeses da época, trabalhando para obter um excelente preparo físico de seus jogadores e marcando as equipes adversárias em pressão alta. De uma certa maneira, contribuiu de forma primordial para o desenvolvimento do estilo mais famoso de se jogar Futebol em toda a história, o Futebol Total.
Apesar de obter grande sucesso com o clube, parecia destinado a se manter apenas como coadjuvante com relação a títulos, chegando por três vezes à final da KNVB Cup - a Copa da Holanda - e perdendo todas elas, para o Willem II, Fortuna Sittard e Sparta Rotterdam, respectivamente.
Entretanto, a maré viraria para o competente treinador austríaco no ano de 1968, quando, mais uma vez, o ADO chegou à final da KNVB Cup. Nesta oportunidade, o título não escaparia das mãos dos comandados de Happel, que bateram o poderoso Ajax por 2 a 1.
Happel seria contratado pelo Feyenoord, no ano de 1969, tendo em vista a sua surpreendente trajetória comandando o pequeno clube da cidade de Haia. Em Rotterdam, conquistaria suas primeiras glórias de grande porte.
Já na sua primeira temporada sob a batuta do esquadrão do De Kuip, a de 1969-70, conquistou a Copa da Europa (hoje UEFA Champions League), em uma jornada fantástica, derrotando Milan, Vörwarts Berlin e Legia Varsóvia, culminando com uma Final contra o legendário Celtic de Jock Stein, time que era conhecido como os Leões de Lisboa, campeões do mesmo torneio em 1967.
A vitória por 2 a 1 no estádio San Siro garantiu o primeiro título do torneio para um clube holandês. Esta conquista lendária elevou Ernst Happel ao status de lenda na Holanda, junto com um grande time, que contava com estrelas da futura Laranja Mecânica, a impressionante Seleção Holandesa da década de 1970, como Rinus Israël, William van Hanegem e Wim Jansen, além do austríaco Franz Hasil e o artilheiro sueco Ove Kindvall.
No mesmo ano de 1970, o Feyenoord disputaria o título da Copa Intercontinental contra o violentíssimo time do Estudiantes de La Plata.
Na temporada anterior, o clube argentino proporcionou uma verdadeira guerra contra o Milan, sendo que na segunda partida, disputada em La Plata, vários jogadores do clube italiano haviam sido agredidos impiedosamente e sem qualquer pudor.
Entretanto, apesar das contínuas provocações dos platinos, e de iniciar a partida perdendo por 2 a 0, Happel e o esquadrão holandês conseguiram um empate heroico, com gols de van Hanegem e de Kindvall, levando um placar neutro para a segunda partida, a ser disputada em Rotterdam.
Jogando em casa, o Feyenoord não deixaria a audácia e a violência argentina levarem vantagem. Numa partida ainda mais violenta e tensa que a anterior, os holandeses venceriam por 1 a 0, com um gol do defensor Joop van Daele, conquistando o título de Campeões Mundiais de Clubes, a maior glória da história do clube.
Happel treinaria o Feyenoord por mais dois anos após a conquista do Mundial, vencendo o Campeonato Holandês na temporada seguinte, 1970-71. Deixaria o clube em 1973, buscando novos desafios e tentando evitar a acomodação de sua carreira. Deixaria muitos amigos, muita história e muita admiração em Rotterdam.
Passou rapidamente pelo Sevilla, da Espanha, onde não conseguiu se adaptar adequadamente, se transferindo em 1975 para o Club Brugge, da Bélgica.
No Brugge, comandaria um time sem estrelas, mas que jogava um Futebol ao seu modelo, de pressão na marcação, toque de bola curto, envolvente e objetivo. Venceria o Campeonato Belga nas três temporadas em que treinou o clube, em 1975-76, 1976-77 e 1977-78. Venceria, também, a Copa da Bélgica na temporada 1976-77.
Ainda, chegaria na Final dos dois maiores torneios continentais da Europa. Na temporada 1975-76, na Copa da UEFA, e na temporada 1977-78, a Copa dos Campeões da Europa. Em ambas as oportunidades, sucumbiria ao poderosíssimo time do Liverpool, multi-campeão no fim da década de 70 e da década de 80.
Em 1978, assumiria talvez o maior desafio da sua vida: treinar a seleção da Holanda para a Copa do Mundo.
Comandaria uma equipe poderosa, vice-campeã do Mundo em 1974, e que surpreendeu o planeta com uma forma inteligente e eficaz de se jogar Futebol. Tratava-se de um esquadrão de muito talento, embora sem o maior jogador da história do país, Johan Cruyff, aposentado da Seleção Holandesa e que rejeitava jogar em um país sob Ditadura Militar.
Após uma primeira fase conturbada, classificando-se em segundo lugar de seu grupo, apenas pelo saldo de gols maior que a Escócia, a Holanda conseguiu classificação para a Final, batendo a Áustria e a Itália, empatando antes com a Alemanha Ocidental.
Na partida final do torneio, Happel e seus comandados enfrentariam a dona da casa, a Argentina. Após iniciarem perdendo por 1 a 0, com gol de Mario Kempes, a Holanda passou a jogar mais que os anfitriões, empatando aos 36 minutos da segunda etapa em uma cabeçada do reserva Dirk Nanninga. Mas o destino iria trair Ernst Happel.
Aos 45 minutos do segundo tempo, Robbie Rensenbrink acertaria o poste do goleiro Fillol, e a partida se decidiria na prorrogação pela primeira vez na história das Copas.
Mario Kempes marcaria um golaço, uma mistura de pura técnica e raça, aos 14 minutos da primeira etapa, e Daniel Bertoni marcaria um gol irregular, após carregar a bola com a mão dentro da área, sacramentando o resultado de 3 a 1 e a vitória argentina.
Voltaria à Bélgica em 1979, passando brevemente pelo Harelbeke, e assumindo o Standard Liège, onde venceria a Copa da Bélgica na temporada 1980-81 e a Supercopa da Bélgica, em 1981.
No mesmo ano de 1981 assumiria o comando do HSV, também conhecido no Brasil como Hamburgo. O já experiente Happel comandaria, mais uma vez, um time sem grandes estrelas, mas disciplinado taticamente e eficiente nas investidas de ataque.
Venceria o Campeonato Alemão nas temporadas 1981-82 e 1982-83, além da Copa da Alemanha na temporada 1986-87. Seria derrotado, já na sua primeira temporada, pelo Göteborg, na Final da Copa da UEFA.
A sua grande glória no clube hamburguês, entretanto, seria, mais uma vez, continental, e viria no ano seguinte.
Em 1983, o HSV venceria a Copa da Europa, derrotando, respectivamente, Dynamo Berlin, Olympiakos, Dynamo Kiev, Real Sociedad, e na Final, o fantástico esquadrão da Juventus - que contava com Michel Platini, Zbigniew Boniek, Paolo Rossi, entre outros - por 1 a 0, com gol do hoje famoso técnico Felix Magath.
Assim como no Feyenoord, Happel conquistou a maior glória da história do clube em que comandava.
Na sua segunda disputa da Copa Intercontinental, enfrentaria o Grêmio. Desta vez, Ernst Happel não teve a mesma sorte da primeira oportunidade em que disputou o torneio. Mais uma vez, seria derrotado na prorrogação após empate em 1 a 1 no tempo regulamentar, com dois gols do jovem craque brasileiro Renato Portaluppi, que definiu o placar em 2 a 1.
No ano de 1987, já bastante veterano, retornou à sua terra natal, a Áustria, para finalmente treinar um time local. O destino foi o FC Swarowski Tirol, fundado em 1986, após obter finalmente a licença para disputar a Bundesliga austríaca.
Happel, vencedor nato, conquistou por duas vezes o Campeonato Nacional da Áustria, nas temporadas 1988-89 e 1989-90, bem como a Copa da Áustria em 1989, permanecendo em Innsbruck até 1991, quando assumiria a Seleção da Áustria.
Infelizmente, comandou a seleção de seu país por apenas onze meses.
Ernst Happel faleceu em 14 de novembro de 1992, duas semanas antes de completar 77 anos de idade, em decorrência de um câncer de pulmão, herança de uma vida toda como fumante.
Um homem carinhoso, que amava sua família e o Futebol acima de tudo, era um dos grandes pensadores do jogo. Estava à frente do seu tempo, instituindo a pressão alta no campo de adversário. Além disso, era uma pessoa calma, que estava sempre de bom humor e passando confiança para seus atletas.
Deu nome, postumamente, ao maior estádio da Áustria, o antigo Praterstadion, hoje, chamado de Ernst Happel Stadion. Em 1990, também recebeu a condecoração da Medalha de Prata da Áustria, por conta dos serviços prestados ao seu país.
Foi eleito o maior treinador da história da Áustria, e foi incluído pela IFFHS como um dos 100 melhores jogadores do Século XX.
É, juntamente com Jupp Heynckes e José Mourinho, um dos únicos treinadores a vencerem a UEFA Champions League por dois clubes diferentes - Feyenoord e HSV - bem como um dos raros treinadores a vencer o Campeonato Nacional por clubes de quatro países diferentes - Feyenoord, Club Brugge, HSV e FC Swarowski Tirol.
Abaixo, segue um resumo dos títulos que Ernst Happel conquistou, tanto como jogador quanto como treinador:
Como jogador:
- Campeonato Austríaco: 1946, 1948, 1951, 1952, 1954, 1957;
- Copa da Áustria: 1946;
- Zentropa Cup: 1951;
Como treinador:
- Copa da Holanda: 1967-68;
- Campeonato Holandês: 1970-71;
- Campeonato Belga: 1975-76, 1976-77, 1977-78;
- Copa da Bélgica: 1976-77 e 1980-81;
- Supercopa da Bélgica: 1981;
- Campeonato Alemão: 1981-82 e 1982-83;
- Copa da Alemanha: 1986-87;
- Campeonato Austríaco: 1988-89 e 1989-90;
- Copa da Áustria: 1988-89;
- Copa da Europa: 1970-71 e 1982-83;
- Copa Intercontinental: 1971.
Cansou? Esse é o currículo resumido de Ernst Happel.
Definitivamente, o mago austríaco faz parte da história do Futebol mundial. Seja pela categoria como jogador, pela inteligência e pelas glórias obtidas na casamata, ou ainda pelo grande homem que foi.
Com certeza, Happel deve estar treinando um timaço no campeonato do Céu. É claro, marcando sob pressão, tocando a bola e chegando na frente da goleira com muita facilidade...
Definitivamente, o mago austríaco faz parte da história do Futebol mundial. Seja pela categoria como jogador, pela inteligência e pelas glórias obtidas na casamata, ou ainda pelo grande homem que foi.
Com certeza, Happel deve estar treinando um timaço no campeonato do Céu. É claro, marcando sob pressão, tocando a bola e chegando na frente da goleira com muita facilidade...
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