sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Grandes Treinadores: Béla Guttmann

Na segunda edição da série "Grandes Treinadores", um visionário do futebol. Também, um verdadeiro cigano, espalhando sua sabedoria e conhecimento no mundo todo. Trata-se do húngaro Béla Guttmann.

Guttmann foi treinador de vários grandes times na América do Sul e na Europa, conquistando diversos títulos com praticamente todos eles, além de ter sido pioneiro na modernização do Futebol nas décadas de 50 e 60.

Béla nasceu em 27 de janeiro de 1899, em Budapeste, na época, na Austro-Hungria, de uma família de judeus. Tornou-se jogador de futebol aos 20 anos de idade, no MTK, jogando dois anos por lá, e vencendo duas vezes Campeonato Húngaro. Em 1922, transferiu-se para o tradicional time da comunidade judaica de Viena, na Áustria, o Hakoah Wien, também conquistando uma vez o Campeonato nacional da Áustria.

Após uma turnê de dez jogos do Hakoah Wien nos Estados Unidos, Guttmann e vários jogadores decidiram ficar por lá. Jogou boa parte de sua carreira por lá, no Brooklyn Wanderers, New York Giants, New York Hakoah (time da comunidade judaica de Nova Iorque), New York Soccer Club e Hakoah All-Stars. Encerrou sua carreira voltando ao Hakoah Wien por uma temporada.

Jogou seis vezes pelo selecionado da Hungria, marcando um gol, na sua estreia, contra a Alemanha, em uma vitória por 3 a 0, em junho de 1921.

Onde terminou sua carreira como jogador, iniciou a de treinador. No Hakoah Wien, iniciaria sua movimentada carreira de técnico, passando pelo Enschede e novamente pelo Hakoah Wien em um período de cinco anos, antes de chegar no Újpest FC, onde venceu seu primeiro título na casamata, o Campeonato Húngaro da temporada de 1938-39. Além disso, conquistou a Copa Mitropa de 1939, uma espécie de torneio regional europeu disputado por países do centro do continente.

Sua carreira, e na verdade, de praticamente todos no futebol, passaria por um triste hiato, por conta da II Guerra Mundial. Guttmann, judeu, relatou ter conseguido fugir para a Suíça, território neutro, escapando dos Nazistas. Seu irmão mais velho não teve a mesma sorte, morrendo em um dos campos de concentração.

Em 1945, após o término da Guerra, assumiu o comando do Vasas SC por um ano. Por conta da falta de abastecimento de alimentos, insistia em receber seu salário na forma de vegetais! Treinou o Cocianul Bucharest, novamente por um ano, saindo por conta de um diretor tentar intervir na escalação de Guttmann.

Em 1947, voltou ao Újpest FC, na época Újpesti FC, conquistando novamente o Campeonato Húngaro. Na temporada seguinte, sucedeu Ferenc Puskás Sr., o pai do monstro sagrado do Futebol, Ferenc Puskás, no Kispest A.C. Entretanto, acabou tendo sido demitido por ter problemas pessoais com o jovem jogador.

Em 1949, acompanhando vários compatriotas treinadores e jogadores, migrou para a Itália. Passou, primeiramente, pelo Padova Calcio e pelo Triestina, antes de curtíssimas passagens pelo Quilmes, na Argentina, e pelo APOEL, do Chipre.

Finalmente, em 1953, assumiu o comando do Milan, onde se tornaria mundialmente conhecido. Treinou craques como Nils Liedholm, Juan Schiaffino e Gunnar Nordahl. Na sua segunda temporada, liderava o Milan no primeiro lugar do Campeonato Italiano, quando uma disputa com os dirigentes do clube o levou a ser demitido. Numa coletiva, surpreendeu a todos, disparando polemicamente: "Fui demitido mesmo não sendo um criminoso ou homossexual. Adeus!".

Treinou o Lanerossi Vicenza (hoje Vicenza Calcio) em uma temporada, antes de assumir o Honvéd, onde treinaria a base da legendária equipe da Hungria nos anos 50, comandando jogadores como Gyula Grosics, Gyula Lóránt, Lászlo Budai, Jószef Boszik, Sándor Kocsis, Zoltán Czibor e novamente o craque Ferenc Puskás.

Em uma turnê do Honvéd pelo Brasil, quando jogaram contra times como Botafogo, Flamengo e uma seleção entre esses dois times, resolveu ficar por aqui, como já havia acontecido na sua época de jogador. Treinou o São Paulo, vencendo o Campeonato Paulista de 1957.


Foi no Brasil que ele ajudou a popularizar o 4-2-4, tática dominante no final da década de 50, na década de 60 inteira e no início da década de 70.

O 4-2-4 foi criado, pela lenda húngara Márton Bukovi, em represália à rigidez do antigo W-M. A intenção era criar um esquema tático que aliasse defesa e ataque fortes. A ideia era usar 6 jogadores de ataque, e 6 jogadores de defesa, tendo em vista a aproveitar a evolução constante do preparo físico e da qualidade técnica dos jogadores.

Esse sistema permitiu maior solidez defensiva, pelo maior número de jogadores jogando na linha defensiva. Além disso, eram necessários jogadores que soubessem conduzir e passar a bola, para auxiliar a troca de passes e o ataque, não sobrecarregando os iniciais dois homens puros de meio-campo.

Além de tudo isso, era uma formação totalmente flexível, podendo sofrer mutações durante o próprio jogo.

O esquema encaixou perfeitamente com a mentalidade de jogo do Brasil, caindo nas graças dos times daqui. Santos, com Pelé, e o Palmeiras, com Ademir da Guia, obtiveram grande sucesso utilizando-se da formação, bem como as Seleções Brasileiras de 1958 e 1970.

Guttmann, se aproveitando de seu conhecimento tático, treinou em 1958 o Porto, de Portugal, ajudando Os Dragões a vencerem o Campeonato Português da temporada, recuperando uma vantagem de cinco pontos do líder anterior, Benfica, para onde iria na temporada seguinte.


Lá, embarcou nos tempos mais vitoriosos da sua carreira. Dirigiu um time formado por craques como Mário Coluna, Germano, José Águas, José Augusto, Costa Pereira e o maior de todos, Eusébio. Reza a lenda que Guttmann descobriu o jovem Eusébio numa viagem à Moçambique, na época de São Paulo, o contratando assim que chegara no Benfica.

Venceu a Copa dos Campeões Europeus em duas temporadas consecutivas, 1960-61 e 1961-62, batendo, respectivamente, Barcelona e o legendário Real Madrid, penta-campeão na época. Infelizmente, após ter negado um pedido de aumento de salário, foi demitido pelo Benfica.

Em uma frase célebre, declarou e profetizou o futuro das Águias: "Nem daqui a cem anos o Benfica voltará a vencer uma Copa dos Campeões". Desde então, o Benfica foi finalista em cinco oportunidades (1962-63, 1964-65, 1967-68, 1987-88, 1989-90), levando a pior em todas! Essa é a chamada "Maldição de Béla Guttmann".

Antes de encerrar a carreira, treinou o grande time do Peñarol em 1962, que ganharia o Campeonato Uruguaio e a Libertadores por duas vezes, mas não sob seu comando.

Passou ainda, em períodos curtos, pelas casamatas da Seleção da Áustria, Benfica novamente, Servette, Panathinaikos, Austria Wien e pelo Porto, onde se aposentou por definitivo.

Faleceu em 28 de agosto de 1981, em Viena, na Áustria, onde foi sepultado.

Guttmann era um homem muito polêmico. Capaz de frases impactantes, e dono de uma personalidade forte, cheia de confiança, muitas vezes teve problemas de relacionamento com jogadores e dirigentes. Às vezes, no seu trato, era um tanto quanto imprudente. Sobre seus costumeiros curtos períodos no comando de um time, que raramente passava de dois anos, declarou: "A terceira temporada é fatal".

Apesar de sua personalidade, foi um homem que mudou para sempre o Futebol mundial, com sua visão tática, que fez o jogo evoluir, e com todos os seus títulos. Foi um visionário, numa época em que o Futebol estava engessado com a falta de criatividade dos treinadores.

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